terça-feira, 5 de outubro de 2010

Liberdade:

[...] não há ninguém que explique e ninguém que não entenda.(*)

A alguns passos de mim, paro para refletir sobre o que seria liberdade.
Sei que tudo o que eu disser será simplesmente subjetivo, mas vá lá que seja. Não importa. Não quero convencer a ninguém nem a mim. O bom mesmo é que não concordem comigo, para que o mundo não se torne demasiado chato.
E se a abordagem é subjetiva, é do empirismo que parto para esta pequena viagem rumo a coisas minhas, a coisas que me transformam num ser livre. Livre porque nasce em mim a cada dia um sentimento de não pertencimento, de não enraizamento a literalmente lugar nenhum.
Mas isso não significa um não morar, um vagar pelo mundo, tendo apenas o céu azul ou negro como morada. Tenho até endereço... E é bom tê-lo sem precisar pertencer a...
Percebo isso a cada passo que movo pelas cidades, mesmo as que me vizinham, sinto-me bem à toa em qualquer uma delas. E quando deixo os lugares por que passo, não sinto saudades, assim como não sinto saudades de casa. O que sinto é um sorriso calado sempre que rumo ou retorno de algum lugar.
E é desta forma que vejo ser possível a liberdade: não pertencer, apenas ser. Mas e se me perguntarem quanto a minha identidade? Não a tenho?
O que posso argüir é que me identifico com muitas coisas, e essas coisas não pertencem necessariamente ao mesmo lugar. Posso ainda argumentar que não se identificar com coisa alguma pode ser um tipo de identidade. O resto é só liberdade condicional.

(*) Cecília Meireles, em "Romanceiro da Inconfidência".

domingo, 27 de dezembro de 2009

Momento bukowskiano


"Geopoliticus Child Watching the Birth of the New Man" by Salvador Dali (1943)

Fujo a líricas e canções mil!
Fujo do mundo ceciliano!
Quero o chão, o raso,
sentir o cheiro do podre,
o gosto do ácido.
Quero o sexo vadio,
sem nome nem rótulos.
Corpo sem etiqueta.
Como a cerveja no fim de noite.
Não quero o êxtase, prazer indefinível.
Quero o gozo, prazer que arranha
as entranhas do meu corpo.
Chega de figuras de linguagem vãs,
inúteis e artificiais, cheirando à plástico.
Quero a palavra torta,
Sangrando em minhas mãos,
em minha boca...
A palavra no cio, pingando vida,
verdades descabidas,
mentiras necessárias.
Quero a vida sem ambigüidades,
vida sem saber que é vida,
para não discutir a morte.
Quero o concreto...
Poder tocar tudo que me cerca:
as idéias, o olhar...
a aspereza da tristeza,
deliciosamente azeda.

sábado, 10 de outubro de 2009

Olhos meus olhos teus


Sinto falta dos teus olhos
parados no tempo,
murmurando coisas
que só o vento pode ouvir.
Sinto falta dos teus olhos
a me procurarem brilhantes,
a percorrerem-me todo
e estacionarem nos meus.
Agora teus olhos,
que foram quase meus,
fitam-me fugidios, baixos, sem voz.
Procuram perder-me de vista.
Sinto falta dos teus olhos
a fundirem-se nos meus.
- Por que não ouves os gritos desesperados
destes que são teus?

Imagem de Ciça Maria - Rio Claro - São Paulo

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Urbanidade

Envelheceste minha cidade,
como eu entristeci.
Mas ao contrário de mim,
permaneces cada vez mais viva,
pulsante de pessoas que,
pelo seu âmago,
circulam como sangue;
transportam o sumo vital
ao teu contínuo estado de nascimento.
E eu continuo a nascer, todos dias,
Minha cidade,
para a morte.
Já fui teu sangue, percorri tuas artérias,
inaugurei veias, te dei vida.
Hoje, sou órgão sem função,
apêndice de teu corpo.
E o que dirás de mim,
minha cidade,
depois de me arrancares de teu corpo?
Depois do meu embarque no expresso
que parte da última estação?
Não digas nada.
Deixa-me apenas repousar
em teu seio.
E no lugar do epitáfio,
Pregues um apêndice,
O apêndice de minha vida.

Um Prisioneiro

Sou um presidiário...
Sim, prisioneiro de mim mesmo,
de você mesmo,
desse mesmo mundo,
que dividimos.
Refém daqueles
que produzem sociedade.
E eu sou um desses.
A liberdade
que me oferecem
é uma sombra algemada
à egoísmos...
- Em que tempo remoto de minha vida
acreditei ser um homem livre?
- Quando acreditei em mim mesmo.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Olhar Cibernético

Hei! Você que me olha ciberneticamente
todos os dias.
Você para quem faço poesias,
até mesmo canto danço.
Hei! Você que me fala coisas frias.
Você para quem escrevo melancolias.
Eu existo!
E você?
Vai saber...
Só sei que invento você
todos os dias
para as minhas dores
noites frias
Mas se você existe
no tecer desta minha fantasia
apenas tecerei:
- Flores!
- Companhia!
Hei! Você que me espia...

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Criscrismab


Teu olhar monalisa
me perturba,
me atrai como imã.
Teu olhar de amiga
me instiga,
sou presa fácil,
formiga.
Orides Pan-01/08/09

Título da imagem: Monalisa do Sertão, de Ciça Maria, Rio Claro - São Paulo.